Justiça e luta política















Justiça e luta política
Luiz Sérgio Canário

Marx e Engels – A ideologia alemã: Sendo o Estado, portanto, a forma pela qual os indivíduos de uma classe dominante fazem valer seus interesses comuns e na qual se resume toda a sociedade civil de uma época, conclui-se que todas as instituições comuns passam pela mediação do Estado e recebem uma forma política. Daí a ilusão de que a lei repousa na vontade e, mais ainda, em uma vontade livre, destacada da sua base concreta. Da mesma maneira, o direito por sua vez reduz-se à lei.

Marx e Engels – Manifesto do Partido Comunista: Quando, no curso do desenvolvimento, as diferenças de classe tiverem desaparecido e toda a produção tiver sido concentrada nas mãos dos indivíduos associados, o poder público perderá o seu caráter político. O poder político, propriamente chamado é, meramente, o poder organizado de uma classe para oprimir outra. Se o proletariado se eleva necessariamente à condição de classe dominante em sua luta contra a burguesia e, na condição de classe dominante, tira de cena as antigas relações de produção, então, com isto, ele tira também de cena a condição para a existência da oposição entre as classes e para a própria existência dessas classes. E acaba por abolir seu papel de classe dominante. No lugar da sociedade burguesa antiga, com suas classes e antagonismos de classe, teremos uma associação na qual o desenvolvimento livre de cada um é a condição para o desenvolvimento livre de todos

Os dois parágrafos acima dizem de uma forma erudita, e pelos fundadores do marxismo, o que a sabedoria popular já sabe há muito tempo: a justiça nunca defende os pobres, somente os ricos. Ou seja, é óbvio para o mais simples dos trabalhadores, o caráter de classe da justiça. A justiça, como parte da superestrutura da sociedade, expressa às relações de produção da sua estrutura material, relações de produção capitalistas.

É essa justiça que está comprometida há alguns anos com uma tática de cerco e aniquilamento do PT e de suas lideranças. O PT foi um acidente na construção partidária do final da ditadura. Não estava no script. À medida que crescia e ganhava espaço político e eleitoral mais incomodava as classes dominantes. Até que vence as eleições para a presidência da república. Mesmo com a vigência da Carta aos Brasileiros o PT é um risco. E a máquina, que as principais engrenagens são a justiça e a imprensa corporativa, pôs-se em movimento. Primeiro o mensalão. Pôs o PT em suspeita e suas principais lideranças na cadeia, as eliminando da disputa política: José Dirceu, Genoíno, Delúbio, Gushiken.... E Joaquim Barbosa virou herói e o STF e a justiça como bastiões da moralidade, da justiça e do combate à corrupção. Tudo sob os holofotes da imprensa comprometida.

Três eleições depois viu-se que nada disso foi suficiente: Lula se reelegeu e o PT elegeu e reelegeu Dilma. A máquina voltou a girar: veio a lava jato. Aos objetivos anteriores somou-se o principal e maior de todos: acabar com Lula e principalmente com suas chances de se eleger em 2018. A justiça brasileira, considerando o Ministério Público e a Policia Federal como parte dela, passou a se mover inteira, não somente o STF, com esse objetivo. Claro que com o apoio generoso da imprensa. A grande burguesia nacional, subordinada e subserviente, entrou pesado na disputa. O golpe vem para colocar no governo federal o pior das elites nacionais. O cerco se fecha por todos os lados dos espaços institucionais e republicanos.

Lula passa pela maior caçada judicial que se tem notícia. Sua família, seus amigos, nada a sua volta é poupado. Monta-se o que os advogados chamam de lawfare, uma guerra jurídica sem limites e sem tréguas. O que já era certeza, que a justiça é injusta e tem lado, fica evidente: pouco importa se Lula é culpado ou inocente. Pouco importa se há ou não leis que o proteja. Pouco importa se outros que cometeram crimes, e há evidências explícitas disso, seguem soltos e sem processos, que dirá condenação. Condenam Lula a mais de 9 anos de prisão e a pagar uma multa enorme pela propriedade de um imóvel que não é seu.

Ele é inocente? Irrelevante. Nem preso ele precisa ser. Basta ser desmoralizado e inabilitado.
A batalha judicial está perdida. Devemos abandoná-la? Não. É importante denunciar a cada sentença, a cada depoimento, a cada delação, enfim a cada movimento policial e judicial, deixar claro o seu conteúdo, ou falta dele. Deixar claro o seu papel dentro da lawfare em curso.

A garantia da democracia, da legalidade e das instituições é uma bandeira permanente e nunca deve ser relevada ou relativizada. Essas conquistas foram conseguidas à custa de muita luta e sangue. Não podemos permitir o retrocesso da democracia e a perda de direitos. Mas temos que sempre estar entendendo e trabalhando com os seus limites, com o seu conteúdo de classe.

A ninguém interessa mais a vida democrática e livre que a classe trabalhadora e o povo. E a democracia que está sendo ameaçada constantemente há mais de um ano. Deu-se um golpe e na sua sequência uma série de atos e de políticas com o fim de golpear os direitos do povo.

Todas as garantias democráticas, dentre elas a justiça, devem ser preservadas. Mas não é o que está acontecendo. Cada dia o golpe avança e se aprofunda. A batalha pela manutenção das instituições democráticas e da justiça deve ser permanente.

Mas há uma batalha maior sendo travada nesse momento, e essa sim define o resultado da guerra: a batalha política. Nela a questão central não é da defesa jurídica da inocência de Lula. Ele já é culpado aí. A questão central é a defesa política do direito dele e do PT participarem das eleições. E até mesmo do direito de existirem. E essa não é uma batalha para advogados.


É uma batalha para ser travada pelo PT, pela esquerda e pelos movimentos sindicais e populares. É uma batalha da classe trabalhadora na defesa da sua representação política, hoje encarnada principalmente no PT. A derrota do direito de Lula se candidatar não enfraquece somente a ele como liderança. Lula já escreveu seu lugar na história. Ele será sempre lembrado como o maior líder popular que esse país já teve e que promoveu melhorias significativas nas condições de vida e trabalho da classe trabalhadora e do povo. Esse legado ninguém tira dele. A maior prova disso é a recém encerrada Caravana Nordeste e os índices nas intenções de voto.

Mas precisamos travar essa batalha com alta intensidade e o tempo está ficando curto. Precisamos levar para às ruas não a discussão se ele é culpado ou inocente. Para nós no PT e para a classe trabalhadora e o povo ele é inocente das acusações que lhe fazem. Ou como algumas pessoas do povo falam, mesmo que ele não seja inocente ele foi o melhor presidente que o país já teve e precisa voltar para melhorar a vida das pessoas. Mesmo que essa seja uma visão messiânica do papel de Lula na conjuntura e na história, ela expressa a força de sua liderança e da sua capacidade de mobilização e de atração de votos para ele.

O foco das nossas mobilizações deve ser o de garantir o direito de Lula e do PT participarem das eleições em 2018, e até mesmo da existência dessas eleições, independente do que acontece no judiciário. Devemos expor o judiciário como um sistema contaminado, a serviço das classes dominantes e com decisões que estão sempre contra os trabalhadores e o povo. É nesse contexto que Lula está sendo perseguido. Não há justiça, no sentido do senso comum da palavra.

Ainda há tempo bastante para virarmos esse jogo. Mas ele somente será ganho com a mobilização permanente da militância. Com a construção de várias Caravanas Nordeste. Com os trabalhadores e o povo garantindo as eleições e a participação do PT e de Lula, com ou sem a permissão do judiciário.
Precisamos sair da apatia que nos tem tomado conta. Da imobilização e da expectativa que não terão coragem de prender Lula. E que com as eleições, como Lula vai vencer, tudo será como antes.

Como já demonstrado eles têm coragem para qualquer coisa. E com o auxílio precioso de Palocci então!

Luiz Sérgio Canário
Engenheiro e militante do PT em São Paulo

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